Expressa-mente proibida!
(Confissões dolorosas)
Miguel Garcia
Já não faço o tipo do artista que bem disfarça a incongruência que é a pulsão da loucura. Hoje em dia imagino-me consciente demais para tanto. O que fariam os “sonâmbulos” com uma plena consciência do absurdo que aí está estendendo-se ao infinito?
Penso ter fracassado na arte de modelar meu caráter (mentira vital) exatamente com o fim de interpô-lo entre mim e os fatos da vida; o que permitiria ignorar incoerências, alimentar-me de impossibilidades, sem desconfianças que assaltassem de súbito - ser bem sucedido na cegueira. Seria uma vitória peculiarmente humana: capacidade de ser superior ao que aterroriza, Sartre-rizando: sou paixão inútil; irremediavelmente embaraçado; desiludido a respeito de minha verdadeira situação.
Outrora desejei ser um deus, possuindo apenas o equipamento de um animal - esse corpo - irmão asno, contudo, não fui capaz de deter-me e extasiar iludido por muito tempo, despertei:
“E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu...
Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi no espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo”... Álvaro de Campos
Será minha esta vida, meu esse sonho, esse pesadelo, auto-engano?
Confesso: usei idéias para defender minha existência, afugentar o real. Como agir de modo diverso sem dizer adeus à uma felicidade qualquer?
Já não faço o tipo do artista que bem disfarça a incongruência que é a pulsão da loucura. Conforme bem questionaria o Giannetti: auto-engano?
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