segunda-feira, 24 de março de 2008

ACAMPA-CÓPIA-MENTO?

Acampa-cópia-mento?
Miguel Garcia



...“Vê que faças todas as coisas de acordo com o modelo que te foi mostrado no monte”. Heb 8:5

...“tendo a sombra dos bens futuros e não imagem exata das coisas, não pode nunca pelos mesmos sacrifícios que continuamente se oferecem de “ano em ano”, aperfeiçoar os que se chegam a Deus”. Heb 10:1


A Pastora Fátima Nascimento além do seu reconhecido destemor, nobreza nos sentimentos e amor ao bem, provou mais uma vez sua inconteste habilidade na arte de cativar os ânimos. Foi assim que realizou o primeiro Acampamento de Páscoa com a Comunidade Betesda em Lavras.

A idéia de um retiro espiritual no feriado prolongado deixou a congregação mineira assaz entusiasmada... É Uái!. Bom sinal, Deus seja louvado! Igreja viva é assim mesmo - cola
tal qual carrapicho, prende e envolve feito trepadeira, sua brincadeira predileta é o pega-pega. Igreja viva é que nem carrapato: gruda, suga... mela e adere como clara de ovo, enrosca, enlaça. Feito leite coalhado sobrenada líquidos de incertezas, voga a elevação de superfícies ameaçadoras... prazenteira na comunhão é uma igreja viva. Ainda bem que é assim! Quem precisa de ruas de ouro e Alfhavilles Celestes? Ver a alegria assenhorar-se do espírito da irmandade basta. A consumação de campais dos prazeres urgia!..

Ver crianças, jovens, adultos e idosos, em brasas de excitação, conectados aos galhos do tronco de uma aspiração confortadora feito jaboticabas temporãs – suspensos, aluados feito o Apolo atingido pela seta do filho de Vênus, ou ainda, à semelhança de Dafne, horrorizados com a idéia de amar uma vida aprisionada às obrigações do cotidiano, por mais que se afigure “divinamente dotada”.

Já era sabido que a aglomeração festiva proporcionaria colisão de corpos de afetividade, corpos sonoros... carências transbordantes, olhares caçadores, murmúrios cativantes, confissões serenas, silêncios revigorantes, vivências desnudas, solidões imantadoras, utopias possíveis e regozijos responsáveis...

Solta a imaginação que se fazia minúscula no horizonte daquela sede inadiável de amar, surpreendendo o Sol antes de o Sol raiar no grande dia de partirmos para além do topo das melhores esperanças.., víamos nitidamente barracas espalhadas por um gramado denso e macio criando efeito de uma aldeia de família numerosa. Gargalhadas explodiam como se fossem foguetes, abraços e carícias balsâmicas – efervescência das paixões mais intensas e "luxuriantes"... iluminação precária e improvisada facilitando a diafaneidade de almas e corações, boca seca rogando pela abundância das torrentes de Deus ..., jogos, banhos de Sol, de Lua, chuveirada para o excesso de sisudez e piscina pra arrefecer cabeças quentes, descantes, danças, preces flutuando como folhas agitadas pela aragem – como uma branda inquietação da água corrente, fogos de artifício em cada olhar, saborosa e urgente aventura de navegar rumo aos amigos/tesouro/escondido, proeza de ser quem se é nessa vida, de abrir-se, mostrar-se por dentro, caminhar na direção do diverso sem reservas ou disfarces ridículos, pra encontrar-se com Deus, como o novo, o outro e consigo mesmo.

Diante dos felizes prognósticos que se avolumavam a cada instante – figuras mentais das coisas ausentes, conjeturávamos sobre onde, quando e como se daria esse regresso ao Paraíso – redenção do labutar cotidiano.

Resolvidas as questões preliminares e passados alguns dias, como que elevados e impulsionados pelo pó mágico das fadas: Fátis, Cátis, pelas divindades rurais: Pã-Heber, Fauno-Cláudio e pelas ninfas das florestas mineiras (anônimas notáveis), voejamos todos por planícies e cerrados, roçando nuvens, fazendo amor com a dispersão do azul-celeste, extasiados pela colisão dos traços de luz emanando do Rei do dia, até que lá estávamos, acolhidos por uma vegetação abundante e diversificada que cirandava tudo.

A paisagem silenciosamente ruidosa ocultava incessante desfile de insetos Percursionistas. Ancoramos e logo amparados pela melodia de pardais e bem-te-vis, pelo balé dos tucanos - pela dança de suas cores estonteantes incidindo e embriagando o olhar, suspiramos de satisfação.

Ao fundo, montanhas soberbas de aspecto aveludado. Seus contornos bem definidos, sensuais como corpos de negras lavrenses adormecidas de bruços, como que escondendo segredos inconfessáveis e prazeres proibidos por detrás, induzindo olhares ardorosos a empreenderem uma escalada, não como faz o corpo, mas num sentimento... o lugar despertava agradavelmente nossos sentidos.

Por todos os lados "via-se" a deliciosa agitação e encantamento de meninos e meninas de todas as idades explorando cada pedacinho do lugar, degustando sabores com os olhos, com a ponta dos dedos, com a planta de pés desprevenidos, sorvendo a localidade com a sede de quem sob Sol escaldante, laboreia na (panha) de café, escutando a beleza dos tons de verde-azulado, água-marinha, verde-mar, lima, limão, esmeralda, musgo, oliva, verde-floresta, turquesa, menta, lunar... Respirando a delicadeza do feitio, da feição de tudo, lambendo os lábios carnudos dos sonhos satisfeitos e desejos realizados... eis que tudo era bom! Tudo se fez absolutamente novo de baixo do Astro Luminoso. Nosso Acampa-cópia-mento acontecia de fato... e nós... protagonistas da boa notícia sombreada, sorvíamos o prazer.

Foi aí que me vi brincando de pensar com cabeça de grego. Lembrei-me de Platão, sua teoria sobre sombras... cópias... Imaginei se o que de início antecipávamos na instância do desejo e depois concretizávamos no tempo e espaço seria como um rascunho do real - de uma matéria mais densa.

Acampar seria atividade emblemática de um mundo simulado? Pálida imagem, ligeira aparência, silhueta, sombra - espaço que se tornou menos claro pela interposição de um corpo opaco entre ele e o objeto luminoso? Seriam essas delícias naturais representações de possibilidades que o espírito também pode e deve usufruir?

Platão falava sobre arquétipos existentes no "mundo superior" segundo o que as cópias terrenas foram amoldadas.

Li em algum lugar que é certo que o escritor da Carta aos hebreus podia pensar com essas categorias: a terra – mundo físico, natureza, o temporal, como sombras simbólicas, e, aquilo que é imaterial, espiritual e eterno como Arquétipo ideal ou terreno da realidade.

Lendo Hebreus 10:2, possuído por um tipo de substância incorpórea que invadiu minha mente e coração, representei em meu espírito que, além de nos somarmos aos fenômenos migratórios nas estradas e rodovias, por ocasião do que chamamos de férias e oportunidade para o descanso e relaxamento - o que muitas vezes faz com que nos ocupemos mais do que em dias normais de trabalho, precisamos compreender que nosso espírito também tem necessidades de uma ordem de coisas bem parecidas com essas que tanto nos atraem para os acampamentos em feriados prolongados, ele também carece de beleza - festejar de alegria. O que é verdade para o corpo também o seria para o espírito humano. Assim como o nosso corpo, nosso espírito também conhece a exaustão, a solidão, a fome e sede do belo, também suspira de prazer...

Os sacrifícios no temporal tem um enorme potencial de errar o alvo... Existe uma realidade mais espessa, compacta, cerrada... Seria tão bom que aprendêssemos a não privar nossa alma das delícias e descanso nos jardins de Deus... em lugares de eternidade!... E então, vamos acampar?

sábado, 22 de março de 2008

CD Ondas Eternas de Miguel Garcia


Por Carlinhos Veiga






Ondas Eternas, Miguel Garcia Ondas Eternas é o registro das experiências profundas vividas por Miguel Garcia em sua comunidade – Igreja Betesda de São Paulo. Dele jorra uma profusão de sentimentos captados pela sensibilidade do artista. Miguel é poeta mesmo: muito elogiado por “profetas” que têm o dom de brincar com as palavras, como Ricardo Gondim e Rubem Amorese.


O trabalho foge do formato comercial. Possui uma vertente jazzística muito forte. As influências vêm de Frank Gambale, George Benson, Scott Handerson e outros feras da guitarra. Miguel é instrumentista pra valer e joga com as harmonias e solos juntamente com uma banda muito competente. Algumas das canções são quase peças. Liberto do “formato-tempo” imposto pelas gravadoras, deixa o som e as emoções escaparem, fluidos. É CD para ouvir e ouvir... e a cada vez, novas descobertas. Destaque para as canções “Momentos”, “Soli Deo Gloria” e “Ser igual”. Para adquirir o Ondas Eternas, ligue para 11 9203-9101 ou escreva para miguelgarciapoeta@gmail.com


Ouça os temas do novo CD de Miguel Garcia http://www.myspace.com/miguelgarciacomposer



Lavras pra além do cartão postal e das trivialidades confortadoras

Lavras pra além do cartão postal e das trivialidades confortadoras
Miguel Garcia


Lavras do incômodo, do mal estar social, do existo logo desfruto, Lavras do desamparo, do desespero.

Lavras sem gravidade, sem referências, “sem” Deus... Lavras dos falsos profetas, falsos mestres e pastores, Lavras dos lobos devoradores, Lavras do realista verdadeiro, do pessimista e do desencantado.

Lavras dos perdidos no labirinto do progresso mecânico, dos iludidos que sonham alcançar o Ilimitado pela inteligência e não pela fé pura, por diretrizes ditadas pela “igreja” e não pela Graça, pela razão e não pela relação com Deus. Lavras dos “TEMPLOS” refúgios para os tímidos e complacentes, Lavras de uma fé não militante, Lavras dos falsos adoradores e verdadeiros aduladores – da placidez e posições influentes na cidade ao invés de salvação pelo sofrimento.

Lavras que dilui os ensinamentos de Jesus, degradando Sua mensagem. Lavras de “cristãos” que não crêem no Cristo histórico, tampouco em si mesmos.

Lavras refém das companhias exploradoras e dos monopólios: REX (Supermercados), CEMIG (Companhia energética), COPASA (Companhia de saneamento de Minas), Cartel dos Postos de Combustível, Transporte Coletivo, Mercado imobiliário, Educação Privada e Saúde.
Lavras do monopólio religioso organizado, que trata de administrar o que pertence ao domínio privado da alma individual: a religião. Lavras do Clero opressor, das Missas católicas e evangélicas, do povo caução/espectador... Lavras do retorno ao cajado, do fascismo voluntário, do chefe, do patrão do Fuller - autoridade que “alivie a angústia coletiva”...

Lavras das malditas “quebras de maldições”, conferências sobre “batalha espiritual” e pseudos intercâmbios entre igrejas que no fundo visam acoplar as estruturas mais frágeis e débeis. Lavras do Deus eternamente endividado. Lavras dos poucos ricos, bonitos, mandantes, Lavras Senhorial... da menina-moça e do garanhão privilegiados...

Lavras da família patriarcal que relutantemente se vê obrigada a aceitar a negralhada em ambientes, cargos e posições mais “elevadas”, contanto que sejam os de feições mais doces e mais finas, de estampa mais agradável e que nada se altere quanto aos conservadores salários de fome e carga horária abusiva.

Lavras da Maçonaria, que pra além do discurso hipócrita é uma filosofia que cultiva injustiça social, classicismo, desumanidade e que opera com princípios de trabalho escravo, fundamentalismo, desigualdade e exclusão, um câncer que já se alastrou por todo o corpo do tecido social, político e religioso sem encontrar a menor resistência. Lavras que assim como a maioria das prefeituras do resto do país, também está de joelhos ante a Maçonaria, confira essa história infame na matéria extraída do jornal Tribuna de Lavras de 01/03/2008:


“Representantes da Loja Maçônica 20 de Julho, de Lavras, estiveram reunidos nesta terça-feira, dia 26, com a prefeita Jussara Menicucci de Oliveira, para receberem a doação de um terreno para a construção do templo da instituição. A área de 1000 metros quadrados fica localizada na Rua Geraldo Bertolucci, no bairro Monte Líbano.A reunião de entrega contou com a participação do presidente da Câmara Municipal de lavras, vereador Evandro Castanheira Lacerda (Chapisco), e do venerável da Loja Maçônica Deus e Caridade 7ª de Lavras, Dr. Erley Ribeiro de Carvalho. Aldair Ferreira (venerável), Luiz Henrique de Almeida, Luiz Gonzaga, major Diovany, Natalino Pereira Dias e Antonio Moura, representantes da Loja Maçônica 20 de Julho, também participaram do ato”.

Quando um incorfomado amigo nosso, cujo nome prefiro não citar, questionou sobre a possível ilegalidade das “do-ações-de-misericórdia” efetuadas pela Prefeita Jussara Menicucci de Oliveira e seus subordinados, recebeu como resposta as seguintes notas:

“Por incrível que pareça, em Lavras não há Lei que trate dos critérios para doações de imóveis pelo Município. Já questionei certa vez a uma pessoa da Assessoria jurídica da Prefeitura porque um projeto de lei chega apenas com a justificativa do Chefe do Executivo, um laudo de avaliação do imóvel, cnpj do beneficiário e é posto para a apreciação da Câmara. Sempre vejo doações para empresas que não têm ao menos um ano de funcionamento ou até mesmo que ainda não se estabeleceram. Tanto na esfera Estadual como na Federal há legislação específica e critérios rigorosos para a doação, mas aqui o que encontramos é apenas o que está disposto no Regimento Interno da Câmara e na Lei Orgânica, sobre a tramitação de projetos”.

Sem pa-Lavras...

Ao que tudo indica, parece que a maçonaria está conseguindo extrair o melhor proveito dos pastos e rebanhos humanos lavrenses, assistimos a esse vexame enquanto uma burocracia intencional do sistema da barbárie instaurada aqui, nega aos sem teto o direito a moradia, dificultando-lhes a inscrição para compra da “casa própria” (Barraco minúsculo de alvenaria, avaliado em R$25.000 reais), só para ter com o que barganhar votos na próxima eleição, ou simplesmente para superfaturar e revender as tais “moradias populares” posteriormente.

Essa situação é insuportável! Lavra inchada, inchando cada vez mais, Lavras gananciosa, faminta, insaciável.

Lavras dos moradores flutuantes (estudantes universitários) que desejam gozar a qualquer preço, dia e noite, em noites infindas... Lavras desses vampiros sugadores da energia vital daqueles que possuem uma natureza mais profunda - os amantes do silêncio, os de natureza contemplativa e calma. Lavras que dilacera o tecido do respeito e polui os lugares espaciais. Lavras ruidosa... Por que será que faz assim?...

Lavras quietamente pervertida, Lavras de olhares e gestos que falseiam. Lavras sádica e masoquisticamente tranqüila... Lavras escultural e frígida... Se as paredes das velhas construções falassem, Lavras coraria as faces de uma vergonha da cor do urucum...
Lavras bem temperada, gordurenta, salgadinha ou meladinha no Bar do Roberto, nas padarias, docerias, nos lanches, no Tropeiro, Churrascarias... Lavras do Pingo da Coopesal... Pingo/Feiticeiro no corte das carnes, massa de kibe e coisas da culinária.

Lavras da Rosa... nossa querida Rosa... Lavras do Recanto da Goiaba a caminho de Ijaci... Lavras deliciosa pra quem puder pagar... Lavras casinha do REX (Rede de Super-Mercados) - Cão Raivoso e infernal à solta na cidade, espalhando "raiva" e estômagos vazios.

Lavras do turismo sexu-ALL? De certo que não para qualquer um! Lavras dos poucos Hotéis, Motéis, Lavras dos travestis, das prostitutas, Lavras dos freqüentadores de mulheres, crianças e sub-humanos... Lavras da não cultura, não biblioteca pública ideal, não teatro, cinema, não saber, não pensar, não transcender, não ser humano.

Lavras roubada à luz do dia e das noites pela CEMIG (Companhia Energética de Minas Gerais)! Lavras da exploração tarifária – Lavras refém de abutres-oportunistas. Lavras Play Ground da CEMIG, empresa sem compromisso social, ao contrário disso, atua de modo a favorecer seus investidores internacionais e só. Duvida? Então leia um artigo escrito por um Frei de Belo Horizonte que vem atuando em todo o sul de Minas como um verdadeiro porta voz dos pensamentos e sentimentos divinos, como um defensor dos pobres, oprimidos, desvalidos em todos os sentidos, o Frei Gilvander:

“Uma pesquisa realizada nas contas da CEMIG verificou que enquanto as famílias pagam até R$600,00 o mega watt (1000 Kw) de energia, as empresas pagam menos de R$ 126,00 (ou seja, as famílias pagam seis vezes mais que as empresas); enquanto o ICMs pago pelas famílias em MG é de 30% (o mais caro do Brasil), o das empresas consumidoras é de 18%; Além do ICMs as famílias pagam também PASEP, COFINS e taxa de iluminação pública, o que resulta em 42,5% de imposto sobre o preço da energia. Enquanto as famílias consomem apenas 16,9% da energia vendida pela CEMIG em MG, as empresas consomem até 58%; enquanto o total pago pelas famílias chega a 36%, o total pago pelas empresas somam à receita da CEMIG 32,87%; enquanto a inflação de 1997 a 2005 foi de 82,08%, a tarifa de energia subiu 246,61%”.

Lavras do funesto PA (“Pronto Atendimento”, “Pronto Socorro Público”), Lavras da vergonha, do abandono absoluto, do desumano em sua face mais cruel e demoníaca. PA´s das filas de espera torturantes, dos funcionários conformados, dos bancos de concreto frios e duros como o coração das autoridades públicas Lavrenses. Lavras da medicina que se põe a serviço do funcionamento social dos pacientes, estes, coisificados.

PA´s de corredores cemitéricos/catacúmbicos, becos de SPAWNS, apropriados para os assim considerados: (seres do inferno). Lavras dos raros e mau preparados médicos - “doutores” maquinais que se revezam no truque sem graça de aparecer e desaparecer o tempo todo, sem dar a mínima para ninguém... Nestes lugares falta de tudo: instalações dignas, equipamentos adequados e disponíveis, funcionários bem treinados, médicos sensíveis e competentes, humanidade e vergonha.

O descaso com a saúde pública é tão grande que obriga o mais comum dos mortais lavrenses a viver o papel de Prometeu acorrentado ao rochedo de sua mísera condição econômica e a fazer de si mesmo um símbolo da resistência magnânima ao sofrimento imerecido, e da força de vontade que resiste à opressão, enquanto uns poucos deuses os punem por pecados que não cometeram, enviando abutres que devoram o fígado da esperança todos os dias, “órgão vital” que só se regenera porque o Deus Conosco irrompe e pervade toda essa estrutura caótica trazendo alento, apoio e sustent-ação.

Lavras massa, Lavras da não família, da antifamília, Lavras da mãe pobre, parideira, Lavras Casa Grande e Senzala, Lavras do negro massa, negro multidão. Lavras da fala gorda, descansada, amaciada, de sílabas moles e duras.

Lavras das mucamas quase alforriadas, das negras de ganho, Lavras do negro de eito, dos moleques de pancadas do nonhô e nhanhãs brancas pós-modernos. Lavras dos feitores, capatazes e capitães do mato – polícia de Lavras...

Lavras dos moleques de brinquedo, das negras Mucamas/mesa/e/banho, das amas de peito...Lavras das beldades serviçais... Lavras das taras... Lavras dos estupros do corpo e da alma... Lavras do banzo que ainda dá cabo de muitos.

A saudade outrora da Mãe - África, agora diz respeito a um lugar fora do espaço e do tempo... uma cena imóvel e suspensa na memória, um vazio, nostalgia do Éden perdido... No passado houve os que se suicidaram comendo terra, enforcando-se, envenenando-se com ervas e potages dos mandingueiros, houve os que de tão banzeiros ficaram lesos, idiotas. Não morreram, mas ficaram penando. E sem achar gosto na vida normal - entregaram-se a excessos, abusando da aguardente, da maconha, masturbando-se... E como o passado nunca está morto, como ele nem mesmo é passado e como a história está aí ao nosso redor, sabemos de novos banzos, idiotices, suicídios, ervas e até mandingueiros.Um banzeiro de hoje pode até ser feliz por ser católico, evangélico, maçom, espírita, agnóstico, ou simplesmente um dos tantos alcoolistas que penam pelos morros daqui feito fantasmas torturados. Outros vão direto à maconha, crack, e pronto!...

Lavras dos negros, brancos, dos brancos negros e dos negros morenos. Lavras do sangue bom, da “gente humilde...que vontade de chorar”, dos suicidas, lesos, zumbis, narcotizados. E se é verdade que drogar-se é experimentar um tipo de morte, um tipo de mumificação para escapar de alguma realidade indesejável, os novos banzeiros daqui estão no caminho certo.

Lavras da competição predatória, dos comandos autoritários, da obediência irrestrita.
Lavras dos sujeitados, obedientes a determinações vindas de fora... Lavras de subjetividade industrial, fabricada, moldada pelo capitalismo neoliberal. Lavras que mantém seu mercado do poder. Lavras que transforma artificialmente em sujeitado um sujeito natural. Lavras do condicionamento de massa. Lavras do Darwinismo soci-ALL e eclesi-All. Aqui se devora tudo e todos... aqui, dentro ou fora da “igreja” a proposta teórica põe ênfase nas dimensões: espécie, aptidão e seleção natural. Lavras da violência por tudo e por nada. Salve-se quem puder!

Aqui é na base do fundamentalismo radical e a transcendência se presta a justificar a exclusão social e outros fenômenos, como a escravidão e a dependência político-econômica. O lavrense dá tudo de si, dá a própria vida para manter-se vivo – preservar sua espécie, mas a recíproca nem sempre é verdadeira. De acordo com a “seleção natural” daqui, sobrevivem os mais “aptos”, os que não o fazem em nada contribuem para a história da espécie, a competição leva à evolução e isso vale também para os seres humanos, em suma, o indivíduo deve deixar que os fenômenos “naturais” se desenrolem, permanecendo passivo - tudo pelo bem comum.

Lavras tolerante com uma gama muito variada de estimulantes e substâncias que alteram o comportamento em tentativa desesperada de lidar com sentimentos de frustração, tristeza, raiva e solidão.

Lavras que não quer ser ela mesma e por conta disso busca formas inventivas e ao mesmo tempo trágicas para fugir de sua realidade. É mais fácil fazer uso de algum tipo de substância modificadora de comportamento em vez de colocar a vida em ordem de modo a sentir-se naturalmente calmo, energizado, relaxado ou desperto.

No afã de se pegar o caminho oposto, vale até uma dose do já famoso “ópio do povo” – reteté, louvorzão, mensagens de auto-ajuda, cruzadas “evangelísticas.

Lavras pensa que milagre é água...
Milagre não é água não!
Milagre “só de vez em quando”...
Água vem da COPASA e é super-faturada!

Lavras dos estímulos poderosos, da frustração e depressão. Lavras dos atores, dos palhaços karamazóvicos, dos modificados, Lavras do circo a céu aberto e da tenda azul...

Lavras das “possessões”, não consegue pensar com lucidez. Lavras do vizinho barulhento, do excesso auditivo...

Lavras insatisfeita, espera encontrar felicidade no fundo de uma garrafa ou latinha de cerveja. Sem que tenha de esperar muito tempo, encontra a náusea que a obriga a vomitar toda a lembrança de divertimento e relaxamento. Será que Lavras faz isso de propósito? Será que as pessoas se entregam às drogas e ao vício para se punirem porque se recusam a aceitar o perdão e o amor curativo de Deus? Estariam relutantes em entregar a vida nas mãos do Outro?

Lavras entrevada no leito da tradição ou petrificada por tédio e medo debruçada em alguma janela... Lavras que abraça o seu desespero para quem sabe poder usá-lo como um álibi ou prova, num futuro não tão distante...

Lavras que des-confia e que depois, continua e desdenha de vez, esquece. Lavras que diz o que você quer ouvir. Lavras que não recebe dignamente pelo trabalho de suas mãos, Lavras dos es-cravos e dos cravos nas mãos, nos pés, nos olhos, na mente e na alma, Lavras dos cristos.

Lavras “universitária” – o prazer bem à frente do saber.
Lavras que obriga a legislação a correr atrás das mais recentes maneiras de gozar. Lavras da acumulação do saber e da falta de sabedoria. Lavras... Lavras... Cemitério de quilombos imemori-ais... Quantos ais ainda ecoam por aqui!Cidade do Apartheid, de vidas separadas... Laboratório do Império, reduto de espiões e ladrões de patentes.Lavras das meninas e moleques de brinquedo dos nossos dias, Lavras das camas, redes, bancos de automóveis e de caminhões rangendo indignados pó sentirem o pesar dos estupros constantes.

Lavras dos puteiros, travestis, Lavras dos matinhos, dos banheiros dos postos de estrada, do CARNA-LAVRAS, das parideiras de novembro...Lavras dos celulares hipnóticos, dos prazeres orificiais fabricados artificialmente, Lavras das novidades, dos brinquedinhos orgásmicos... Lavras dos automóveis equipados com som pesado...

Lavras da inveja, inveja que é motor de Lavras... inveja que trabalha muito, trabalha sem descanso, descanso é para os que não são invejosos... Lavras dos olhos doentes... Lavras da admiração sem esperança. Lavras que também faria Jesus chorar. Lavras, Lavras, quantas vezes... Lavras dos Reis do gado, curral de eleitores complacentes e dóceis feito vacas hindus.... “Eh oh oh vida de gado povo marcado eh povo infeliz ....”

Lavras que tem de se virar sozinha: quem quiser que plante uma farmácia no quintal de sua casa (se tiver casa e quintal), que construa um fogão à lenha, que banhe-se com a água aquecida pelo mesmo fogão... Lavras da irmã Aparecida, santa mulher corajosa, inventiva, batalhadora e sobre-vivente! Lavras pobre coitada...

Lavras rica, abastada e indiferente... Lavras degradada e apática... Lavras das manias, da herança escravocrata e senhorial, Lavras do mandonismo, do Sinhozinho maconheiro e motorizado, Lavras das hordas da barbárie, da falta de compromisso, do desamor à flor da pele, Lavras dos cantões, dos casarões fantasmagóricos, do antiquado, do chicote dependurado no batente da porta, do sinal... do alerta, do castigo...

Lavras dos presídios hiperlotados, Lavras das Pandoras, Prometeus, Icaros, Dédalos, Lavras de todos os deuses de pele escura e castigada pelo Sol. Lavras das faculdades sem Lavrenses, Lavras da falência na educação pública – sem pa-Lavras pra d-escrever o tamanho do caos no ensino público e privado por aqui...

Lavras de bárbaros doutores, das fornadas de diplomas...Lavras sem lei, sem justiça, Lavras crackeada, das quadrilhas de políticos, religiosos, maçons, policiais e as outras, Lavras do medo... Lavras da ambição coronelista que pune desafetos nos troncos e chicotes pós-modernos, Lavras dos “donos da terra”, da riqueza e dos meios de produção...

Lavras opressora... Lavras que mata os poetas-profetas... Lavras do PHARMAKON, da poção mágica, das liberdades ameaçadoras, dos seres mutantes, ninho de X-mans, Lavras dos homens fabricados, Lavras do céu de chumbo, Lavras vazia, filha de uma “tradição acadêmica” que vem expulsando Deus desde o mundo antigo...

Lavras gadarena: seus porcos, vão muito bem obrigado! Lavras do ideal de ideólogos mil, Lavras do sonho trampolim... Lavras ponte pra o Paraíso... Ante-sala de um Oásis - Edens das Terras da realidade (“Alguma coisa acontece no meu coração”...), Lavras rota de fuga de um mundo de sombras simbólicas... Lavras o caminho, o sacrifício, Lavras a punição...
Lavras, Lavras, “Se me cantas tu me Lavras”, alardeou um bem humorado e desesperado “homem de Deus"...

Ouvi certa feita de um clérigo ideólogo das coisas missionárias, bravateando sobre suas supostas e mais recentes manobras políticas, o seguinte:

“Se Jesus não operar, dou um jeito e faço eu mesmo”!
Fala de um herói decadente? Brado messiânico equivocado?

Lavras da Tenda-Azul, da igreja do Alemão... icabode! Foi-se a glória de um deus, e agora?

Nada mais da contemplação num relance, dos reinos da terra, nada de “favores voluntários”, do-ações generosas e const-antes..., nem tampouco aqueles fáceis acoplamentos estruturais, nada mais de Darwinismos eclesiais... Icabode!

E agora? Quem sabe a SUPER Fátima venha nos restituir a glória, mudando como “deusa” o curso da história, por causa das pessoas daqui... Como proteger a aliança, se eu deixo fora dela coisas que penso serem minhas?

Como permanecer igreja e criança,
Com fendas na armadura do tamanho de injustiças?
Como cruzar espadas com demônios
Se agasalho atitudes e projetos tão errôneos?
Icabode – Miguel Garcia

Ai, ai, ai, ai...

Lavras que não cabe nas pa-Lavras, Lavras da fé contra a esperança...Lavras pra além do cartão postal e das trivialidades confortadoras.

quinta-feira, 20 de março de 2008

FATOR HIERARQUIA

FATOR HIERARQUIA
Por Al Vimar

Embora a quase totalidade dos pensadores anarquistas repudiem aquilo que entendem por Religião, Deus, etc. nenhum deles poderia negar a presença desses valores e crenças no seio do povo.

O FATOR HIERARQUIA

Embora a quase totalidade dos pensadores anarquistas repudiem aquilo que entendem por Religião, Deus, etc, nenhum deles poderia negar a presença desses valores e crenças no seio do povo e a sua constante manifestação em todas as civilizações desde tempos imemoriais. Buscar extirpar o sentimento religioso das multidões é como tentar podar algo inerente ao espírito humano.

Embora o conhecimento que um homem tem de Deus tenha que ser necessariamente expresso em termos humanos, infelizmente, tais termos nunca são suficientes para essa tarefa, todavia, isso não significa que a Religião se traduza, ou mesmo se esgote, em atitudes estereotipadas e fingidas de pessoas travestidas de religiosas – autômatos, insossos, sem graça, sem vida, que nos causa tanto asco nas igrejas, ruas, trens, emissoras de rádio, praças e TV. Por mais repugnante que seja o uso que certas pessoas fazem da Religião, isso não justifica o combate da Religião em si.

Ao contrário do que muitos pensam, o sentimento religioso não pode ser considerado nocivo ou algo que necessariamente se opõe à anarquia. O argumento mais forte para o descarte da Religião, apresentado pela maioria dos anarquistas, diz respeito ao uso que os poderosos fazem desse sentimento religioso presente no povo: matéria prima a serviço da dominação.

O estado, o capital e a propriedade dos meios de produção, podem e devem ser abolidos, e a Religião pode perfeitamente contribuir para isso na medida em que assume seu caráter original de responsabilidade em prol da instituição da justiça, da liberdade e da solidariedade humana.
Em vez disso, as igrejas ensinam quase sempre que a relação de Deus para com a humanidade é a de um Soberano que lá de seu trono força a obediência pelo exercício de um poder irresistível – o arquétipo do Poder do Estado. E quase nunca que trata-se de um Pai que constrange pelo poder de um amor que busca e cuida.

Por muito tempo se tentou inutilmente substituir o calor da espiritualidade humana, pela frieza do cientifismo. Desse ponto de vista, nós anarquistas fariamos melhor se em lugar do ateísmo ou do anti-teísmo pregassemos a anarquia na Religião tanto quanto pregamos a anarquia na política e na economia. O chefe religioso e o Clero que a ele se subordina “pastoreando” o povo são tão nocivos para as pessoas e para a Religião quanto o proprietário e a pirâmide de administradores são nocivos para os trabalhadores de uma empresa e para a economia. A Religião sem o chefe religioso e o sem clero que a controla e domina pode e deve funcionar como instrumento de liberdade, justiça e solidariedade humana, nunca como instrumento para a conquista e para a subserviência como vemos por toda parte. O que deve ser combatido é a utilização e o cultivo do sentimento religioso popular enquanto tapume que cega os olhos do povo à realidade de exploração e miséria em que ele vive, deixando-o à mercê das classes dominantes. Dessa forma, a Religião se torna uma máquina de controle da mente do povo, e um atalho para a obtenção de fama, poder e dinheiro para seus dirigentes.

Quanto à ciência, por mais positiva que possa ser, ela jamais substituirá o sentimento religioso e jamais explicará todas as coisas e fenômenos, principalmente as principais perguntas que martelam sobre nossa vida. De qualquer forma, não podemos impedir outras pessoas de exercitar seus corações e mentes na procura de suas próprias respostas sobre a fonte da vida e a razão de suas existências.

Não é anti-anarquista reconhecer uma relação Deus x homem, como uma relação Pai/Mãe que constrange pelo poder de um amor que busca e salva suas crianças. Uma criança de quatro anos que brinca à beira do rio, repentinamente rola barranco abaixo e cai nas águas profundas, o pai que passava por ali salta do barco e salva-a da morte. Eis aí a substancia da relação Deus x homem que não pode ser considerada jamais uma relação autoritária.

Kropotkin, o mais famoso escritor anarquista, surgido do Iluminismo e da Revolução Científica, assumia que a ciência substituiria a Religião, que tanto a Igreja como o Estado seriam abolidos, ao mesmo tempo que ponderava sobre um sistema secular de ética que substituiria a teologia sobrenatural pela biologia natural. Ora, esse “sistema secular de ética” e essa “biologia natural” de Kropotkin estava muito mais próxima da Religião do que a teologia sobrenatural dos clérigos de todos os tempos. Infelizmente, outras teorias que não as de Kropotkin, acabaram prevalecendo e ensinadas nas escolas, tornando-se, em parte, vigas mestras na justificação da competição capitalista.

Enquanto os anarquistas não levarem suas mensagens para dentro das igrejas, como o fizeram os Profetas de Israel dos séculos VIII a IV AC — muitos deles anarquistas — a religião permanecerá como um terreno onde a erva daninha capitalista não para de crescer, não porque esse terreno seja estéril ao anarquismo, mas porque ninguém se preocupa em lançar ali a semente anarquista.

O problema mais grave da religião é que a maioria daqueles que se travestem de religiosos, trazem de tudo, menos a religião dentro de si, e muitos daqueles que trazem a religião dentro de si, acreditam em muitas coisas, menos em Deus e Religião, pela forma que essas coisas são apresentadas para ele, pelos estereótipos religiosos, pela falsidade e pelos formalismos religiosos.
Para muitos, a maior dificuldade em aceitar a idéia de Deus vem de associá-lo a um ser hierarquicamente superior. Isso, contudo, pode ser superado pela idéia mencionada acima, de uma mãe ou um pai que ama e cuida de sua criança. Quem teve um pai/mãe digno desse nome sabe que essa relação não implica necessariamente numa relação de poder.

O problema não está na Religião em si mas no que se faz com ela, um instrumento de escravidão, ignorância e opressão, ou uma fonte de liberdade, sabedoria e justiça. Algo que lança o povo nas trevas do preconceito e da ignorância, ou algo que realça a luz do espírito humano.
A verdadeira atitude anarquista para com a Religião é precisamente não atacar nem a fé, nem a Igreja, nem a obediência a Deus (expressão de justiça e liberdade), mas combater o conformismo, eliminar a hierarquia dentro da Igreja, e extirpar a obediência aos homens. Se sempre há pessoas com fé necessitando de Igreja, isso não significa que elas precisam obedecer a homens, da mesma forma que a atitude anarquista mais eficaz no combate ao Estado e à obediência aos homens é convencer as pessoas a não se submeterem ao Estado e a não obedecerem aos homens. A esperança anarquista no que diz respeito à política e à Religião é a abolição da hierarquia, que trará consigo a abolição do Estado e da Igreja. A questão é que Igreja sobrevive sem hierarquia, o Estado não. O Estado um dia irá finalmente desaparecer, talvez até mesmo a Igreja, mas nunca a fé. Deus para quem quiser, senhor para ninguém!

Al Vimar
Projeto Periferia
http://www.geocities.com/projetoperiferia/9a.htm

Banzo e Lamento Negro


BANZO
Eduardo de Oliveira
Paulista. Nascido em 1926. Professor, conferencista,
político. Autor de Banzo, 1965; Gestas Líricas da
Negritude, 1967; Evangelho da Solidão, 1970.


(Ao meu irmão Patrice Lumumba)

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.

Trago em meu corpo a marca das chibatas
como rubros degraus feitos de carne
pelos quais as carretas do progresso
iam buscar as brenhas do futuro.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.

Eu vi nascer mil civilizações
erguidas pelos meus potentes braços;
mil chicotes abriram na minh'alma
um deserto de dor e de descrença
anunciando as tragédias de Lumumba.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.

Do fundo das senzalas de outros tempos
se levanta o clamor dos meus avós
que tiveram seus sonhos esmagados
sob o peso de cangas e libambos
amando, ao longe, o sol das liberdades.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.

Eu sinto a mesma angústia, o mesmo banzo
que encheram, tristes, os mares de outros séculos,
por isto é que ainda escuto o som do jongo
que fazia dançar os mil mocambos...
e que ainda hoje percutem nestas plagas.

Eu sei, eu sei que sou um pedaço d'África
pendurado na noite do meu povo.


LAMENTO NEGRO
(fragmento)

Eu sinto em minhas veias
o grito dos cafezais.

Enxergo em minhas mãos a sombra
dos meus irmãos vergastados pelo chicote
dos senhores da terra.

Aqueles que carregam o Brasil nas costas
não têm túmulos nem legendas;

seu sono não é velado,
seu nome ninguém conhece.

Hoje eles seguem a sina
de uma sorte inglória...
de um destino obscuro.

Como as grandes noites
que se debruçam no parapeito
do tempo, para espiar o mundo,
a minha raça vem contemplando
e trabalhando para a ventura alheia,
debruçada na grande noite
do desespero.

Hoje, se o progresso despeja-se
pelos jardins do meu tempo,
a Pátria que agora é minha
chora prantos de café.

A pátria de hoje
É um pedaço de tristeza
e de soluço dos meus avós,
atirada pelas tumbas sem legendas.

Os meus ancestrais
foram vassalos dela...
escravos dela
e se esqueceram de viver.

A grandeza da minha terra
tem seus pés fincados
na alma da minha gente,
na fome da minha gente,
oculta nos presídios,
nos mocambos, nas favelas,
na hemoptise que escreve com sangue
a sorte da minha raça.

Não mais farei versos bonzinhos
para o agrado dos meus novos senhores.
Escuta, "Capitão do Mato":

Daqui por diante
só cantarei o destino da gente
que estua em meu sangue de negro.
Meu poema terá o gosto amargo
do desespero do meu povo.

(...)

Se a turbulência das praças
arrastarem as multidões
amotinadas pela fome
lá estará o meu grito de rebeldia.
Ser negro é sentir a pujança telúrica
das raças infelizes.
Senzalas, ritos, cafezais
são símbolos de ontem
que relembram escravidão.
Favelas, salários, sindicatos,
são emblemas de agora, chicoteando
o rosto de meus irmãos. (...)

[De Banzo, 2a. ed. São Paulo: Obelisco, 1965.]

UMA OUTRA PERSPECTIVA DO SALVADOR: JESUS, O REVOLUCIONÁRIO


Uma Outra perspectiva do Salvador: Jesus, o revolucionário
Frank Viola http://www.geocities.com/projetoperiferia/9a.htm


“Se o cristianismo rejuvenescesse, este rejuvenescimento teria que ser de alguma maneira diferente do que ocorre agora. Se a Igreja na segunda metade deste século [XX] pretende recuperar-se das feridas que sofreu durante a primeira metade, então precisara de um novo tipo de pregador. O conveniente chefe de sinagoga nunca vai funcionar. Nem o tipo sacerdotal que desempenha suas funções e recebe sua paga sem outras preocupações, nem o tipo pastoral com sua ‘língua de ouro’ que sabe como fazer para que o evangelho seja saboroso e aceitável a todos. Todos estes tipos foram reprovados e nada resolveram. Outro tipo de líder religioso precisa surgir entre nós. Ele precisa ser do tipo do antigo profeta, um homem que tem visões de Deus, um homem que escuta a voz vinda do trono. Quando ele vir, (e eu oro, oh! Deus! Que não haja apenas um, mas muitos), ele questionará tudo aquilo que nossa civilização considera precioso. Ele colocará em dúvida, denunciará e protestará em nome de Deus e será alvo do ódio e da oposição de grande parcela da Cristandade”.-A.W. Tozer



Jesus Cristo não é apenas o Salvador, o Messias, o Profeta, o Sacerdote, e o Rei. Ele é também o Revolucionário. Tanto que alguns cristãos o conhecem como tal. Sem dúvida, alguns de meus leitores têm lutado contra este pensamento enquanto lêem este livro: “Por quê você é tão negativo a respeito da igreja moderna, Frank!? Jesus não é um caçador de defeitos, uma personalidade crítica. Nosso Senhor não fala das coisas ruins da igreja. Enfoquemos o lado positivo e ignoremos o negativo!”

Tais sentimentos em alto e bom tom expressam um completo desconhecimento de Cristo enquanto mestre revolucionário — profeta radical — orador provocativo — polêmico — iconoclasta — e oponente implacável das autoridades (públicas e privadas) religiosas estabelecidas.

Claro, nosso Senhor não é intrinsecamente crítico ou severo. Ele é pleno de misericórdia e de bondade, e ele ama Seu povo apaixonadamente. Todavia, é precisamente por isso que Ele é zeloso para com sua Noiva. E é por isso que Ele não se comprometerá com as tradições inquebrantáveis que amarraram seu povo. Ele tampouco ignorará nossa fanática devoção a elas.

Considere a conduta de Nosso Senhor enquanto esteve na terra.

Jesus nunca foi nem agitador nem rebelde grandiloqüente. Embora constantemente desafiasse as tradições dos escribas e fariseus. Ele não fazia isso de forma casual, mas deliberadamente. Os fariseus foram os que, pela “verdade” que enxergavam, intentaram extinguir a verdade que eles não conseguiam ver. Isto explica porque sempre houve uma tormentosa controvérsia entre a “tradição dos anciãos” e os atos de Jesus.

Alguém disse certa vez que “um rebelde tenta mudar o passado; um revolucionário tenta mudar o futuro”. Jesus Cristo trouxe uma drástica mudança ao mundo. Mudou à visão de homem sobre Deus. Mudou à visão de Deus sobre o homem. Mudou à visão dos homens sobre as mulheres. Nosso Senhor veio trazer uma mudança radical ao modo antigo das coisas, substituindo-o por uma nova ordem. Ele veio para trazer um novo pacto — um novo reino — um novo nascimento — uma nova raça — uma nova espécie — uma nova cultura — e uma nova civilização.


Leia do princípio ao fim os Evangelhos, e veja seu Senhor, o Revolucionário. Veja como espalha pânico entre os fariseus ridicularizando intencionalmente suas convenções. Numerosas vezes Jesus curou no Sábado, frontalmente rompendo sua querida tradição. Se o Senhor pretendesse aplacar a ira de seus inimigos, Ele bem que poderia esperar chegar o domingo ou a segunda-feira para curar algumas daquelas pessoas. Mas não, Ele deliberadamente curou no sábado sabendo perfeitamente que seus oponentes ficariam furiosos.
Este modo de agir tem um sentido profundo. Certa vez Jesus curou um cego misturando barro com saliva e colocando-os nos olhos do homem. Tal fato foi um desafio direto à ordenança judaica que proibia curar aos sábados misturando barro com saliva! Todavia seu Senhor, intencionalmente, rompeu publicamente esta tradição e com a mais absoluta resolução. Veja como ele come sem lavar as mãos sob o olhar crítico dos fariseus, nova e propositadamente desafiando sua tradição fossilizada.
Em Jesus temos um Homem que recusava render-se diante das pressões da conformidade religiosa. Um Homem que pregava uma revolução. Um Homem que não tolerava a hipocrisia. Um Homem que não tinha medo de provocar aqueles que suprimiram o evangelho libertador que Ele trouxera para libertar os homens. Um Homem que não se importava em despertar a cólera de seus inimigos, levando-os a preparar-se para a luta.

Onde pretendo chegar? Nisso. Jesus veio não apenas como Messias, Ungido de Deus, para libertar seu Povo das ataduras da queda.

Ele veio não apenas como Salvador, pagando uma dívida que não era dEle para quitar os pecados da humanidade.

Ele veio não apenas como Profeta, consolando aflitos e afligindo acomodados.

Ele veio não apenas como Sacerdote, representando o homem perante Deus e representando Deus perante o homem.

Ele veio não apenas como Rei triunfante sobre toda autoridade, principado e poder.

Ele também veio como Revolucionário, rompendo o velho odre com o intuito de introduzir o novo.

Veja seu Senhor, o Revolucionário!

Para a maioria dos cristãos esta é uma nova visão de Jesus. Assim, expor o que vai mal na moderna igreja para que o Corpo de Cristo possa cumprir a intenção última de Deus é uma simples expressão da natureza revolucionária de nosso Senhor. A meta dominante dessa natureza é colocar você e eu no centro do coração palpitante de Deus. Colocar você e eu no centro de seu propósito eterno — um propósito pelo qual tudo foi criado.

O que se necessita, portanto, é uma revolução dentro da fé cristã. Movimentos de renovação não farão isso. Revivamentos não atingirão isso. Ambos foram plenos nos últimos 50 anos. (Eu poderia acrescentar que eles tomam uma nova forma a cada cinco anos). Movimentos de renovação e revivamentos nunca foram suficientemente potentes para quebrar a imensa inércia da tradição religiosa.

Movimentos de renovação e novas formas para a igreja são como mudar as roupas de um manequim. Por mais que troquemos essa roupa nunca daremos vida a ele, não importa quão de vanguarda ela seja. Não! É necessário meter fogo na raiz do problema e acender uma revolução!

O que se necessita é uma completa reviravolta nas práticas correntes cristãs. Todas as tradições que não encontram base nas escrituras necessitam ser abandonadas para sempre.

Necessitamos começar tudo de novo... Desde o princípio. Menos do que isso sai com defeito.

Se você é um discípulo do Revolucionário de Nazaré, do Messias Radical que mete fogo na raiz... Você eventualmente formulará uma pergunta específica. A mesma pergunta que os discípulos fizeram a Jesus quando Ele caminhava sobre a terra. Essa pergunta é: “Por que os seus discípulos desobedecem às antigas tradições judaicas?”. Pegando esta declaração como gancho, o próximo capítulo é o mais importante de todos.

"Um radical de verdade tem que ser um homem de raízes. Em termos que sempre utilizo, "O revolucionário é um 'forasteiro' diante da estrutura que vê colapsando: 



Certamente ele tem que se ver fora dela. Mas o radical vai até as raízes de sua própria tradição. Tem que amá-la: Tem que chorar sobre Jerusalém, mesmo pronunciando sua sentença...”-John A.T. Robinson