Atração fatal
Miguel Garcia
Repreendeu-se pela loucura de ter ofertado lealdade a este ou aquele, de ter acreditado tão cegamente e obedecido com tamanha voluntariedade. Escapou de um encanto que quase o destruiu, refletiu a respeito e nada parecia fazer sentido. Como pode ter ficado tão fascinado e, por quê? As massas seguiriam seus líderes devido à aura mágica projetada por eles, que se afigurariam maiores do que a vida? Os homens adorariam e temeriam o poder, a ponto de dedicarem sua lealdade aos que o "distribuem", ou será que a escravidão acha-se inscrita na alma de cada criatura?
Maldito o fascínio da pessoa que detém ou simboliza o poder. Maldito aquele que, irradiando algo, faz com que outros se evaporem de si mesmos. Maldito sortilégio armadilhoso! Ou será que a ameaça vem dos olhos de quem observa – auras azuis ou douradas, brilho no olhar, mistificação especial? Uma atração irresistível jorra de quem se sente a-traido?
Ele interrogava a si mesmo, dia após dia: se todas as pessoas são mais ou menos semelhantes, por que ardemos com paixões tão monopolizadoras por algumas delas? Por que voluntariar-se à condição de escravo humano, agir sem objetivos determinados e deixar-se governar, como crianças, por meio de biscoitos, bolos e varas de marmelo?
Ele torturava-se, punia-se por ter sido tão intensamente ligado a esta ou aquela personalidade imantadora, por ter feito destas, o centro de seu mundo, sua alegria, energia fontal, alimento para os olhos, néctar para sua alma sedenta, algo que lhe dominava o pensamento e até mesmo os sonhos. Será que distorcia o mundo para aliviar seu desamparo e seus temores? Será que ampliava as dimensões deste ou daquele, para vê-los maiores do que a vida, assim como a criança vê os pais? Ele não suportava a culpa por ter sido tão dependente, ter buscado proteção e força fundindo seu destino com o de “pais e mães” da "igreja" e de outros “lugares”. Viu as coisas como “bem” desejou para sua própria “segurança”. Agiu automática e acriticamente como fazia em seu período pré-edipiano. Rendeu-se passivo a um poder “superior”, caiu em estupor instantâneo e obedeceu como autômato as ordens de um “estranho”. Foi apanhado como que por encantamento, pois ignorava a disposição de sua própria alma para ser escravizada. Ele queria crer que, se perdia sua vontade, era por causa de outrem. Mas acabou por admitir que essa perda de vontade era algo que ele levava consigo como um anelo secreto, uma disposição para reagir à voz e ao estalar de dedos de outro. Por fim desmaiava ante a consciência de que sua auto-suficiência era apenas imaginária - mais uma farsa, assim como a livre auto-determinação, julgamento e escolha independente. Compreendeu o porquê de também ter aderido à moda de filmes que contam histórias de vampiros, algo ligado a medos reprimidos veio à tona: a angústia de perder o controle, de ficar completamente sob o fascínio de alguém, de não estar realmente no comando de si mesmo. Um sermão expositivo, uma canção "ingênua" - circular - repetitiva e "misteriosa", uma boa dose de in-fluência feminina, pode levar um sujeito a perder-se para sempre. Abandonado em seu inferno existencial ele mal podia acreditar no que havia a-con-tecido - no que "fez" de si mesmo, em quem havia se tornado.
Inspirado na obra de Freud, Otto Rank e Norman O.Brown, etc.
Miguel Garcia
Repreendeu-se pela loucura de ter ofertado lealdade a este ou aquele, de ter acreditado tão cegamente e obedecido com tamanha voluntariedade. Escapou de um encanto que quase o destruiu, refletiu a respeito e nada parecia fazer sentido. Como pode ter ficado tão fascinado e, por quê? As massas seguiriam seus líderes devido à aura mágica projetada por eles, que se afigurariam maiores do que a vida? Os homens adorariam e temeriam o poder, a ponto de dedicarem sua lealdade aos que o "distribuem", ou será que a escravidão acha-se inscrita na alma de cada criatura?
Maldito o fascínio da pessoa que detém ou simboliza o poder. Maldito aquele que, irradiando algo, faz com que outros se evaporem de si mesmos. Maldito sortilégio armadilhoso! Ou será que a ameaça vem dos olhos de quem observa – auras azuis ou douradas, brilho no olhar, mistificação especial? Uma atração irresistível jorra de quem se sente a-traido?
Ele interrogava a si mesmo, dia após dia: se todas as pessoas são mais ou menos semelhantes, por que ardemos com paixões tão monopolizadoras por algumas delas? Por que voluntariar-se à condição de escravo humano, agir sem objetivos determinados e deixar-se governar, como crianças, por meio de biscoitos, bolos e varas de marmelo?
Ele torturava-se, punia-se por ter sido tão intensamente ligado a esta ou aquela personalidade imantadora, por ter feito destas, o centro de seu mundo, sua alegria, energia fontal, alimento para os olhos, néctar para sua alma sedenta, algo que lhe dominava o pensamento e até mesmo os sonhos. Será que distorcia o mundo para aliviar seu desamparo e seus temores? Será que ampliava as dimensões deste ou daquele, para vê-los maiores do que a vida, assim como a criança vê os pais? Ele não suportava a culpa por ter sido tão dependente, ter buscado proteção e força fundindo seu destino com o de “pais e mães” da "igreja" e de outros “lugares”. Viu as coisas como “bem” desejou para sua própria “segurança”. Agiu automática e acriticamente como fazia em seu período pré-edipiano. Rendeu-se passivo a um poder “superior”, caiu em estupor instantâneo e obedeceu como autômato as ordens de um “estranho”. Foi apanhado como que por encantamento, pois ignorava a disposição de sua própria alma para ser escravizada. Ele queria crer que, se perdia sua vontade, era por causa de outrem. Mas acabou por admitir que essa perda de vontade era algo que ele levava consigo como um anelo secreto, uma disposição para reagir à voz e ao estalar de dedos de outro. Por fim desmaiava ante a consciência de que sua auto-suficiência era apenas imaginária - mais uma farsa, assim como a livre auto-determinação, julgamento e escolha independente. Compreendeu o porquê de também ter aderido à moda de filmes que contam histórias de vampiros, algo ligado a medos reprimidos veio à tona: a angústia de perder o controle, de ficar completamente sob o fascínio de alguém, de não estar realmente no comando de si mesmo. Um sermão expositivo, uma canção "ingênua" - circular - repetitiva e "misteriosa", uma boa dose de in-fluência feminina, pode levar um sujeito a perder-se para sempre. Abandonado em seu inferno existencial ele mal podia acreditar no que havia a-con-tecido - no que "fez" de si mesmo, em quem havia se tornado.
Inspirado na obra de Freud, Otto Rank e Norman O.Brown, etc.
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