terça-feira, 14 de outubro de 2008

A pele ruim


A pele ruim
Eduardo Galeano

Ao início do século dezesseis, nos primeiros anos da conquista européia, o racismo se impôs nas ilhas do Mar do Caribe. Pretexto e salvo-conduto da aventura colonial, o desprezo racista se realiza plenamente quando se convertia em autodesprezo dos desprezados. Para escapar do trabalho escravo, muitos indígenas se rebelaram e muitos se suicidaram, enforcando-se ou tomando veneno; mas outros se resignaram a outra forma de suicídio, o suicídio da alma, e aceitaram olhar pra si mesmos com os olhos do amo. Para se transformar em brancas damas de Castela, algumas mulheres índias e negras untavam o corpo com um ungüento feito de raízes de um arbusto chamado guao.
A pasta de guao queimava a pele e, segundo se dizia, limpava-a da cor ruim. Um sacrifício vão: depois dos alaridos de dor e das chagas e das bolhas, as índias e as negras continuavam sendo índias e negras.
Séculos depois, em nossos dias, a indústria de cosméticos oferece melhores produtos. Na cidade de Freetown, na costa ocidental da África, um jornalista explica: “Clareando a pele, as mulheres tem mais chance de pescar marido rico”. Freetown é a capital de Serra Leoa: segundo dados oficiais do Serra Leoa Pharmaceutical Board, o país importa legalmente 26 variedades de cremes branqueadores. Outras 150 entram de contrabando.

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