Sobre o significado do mito Edênico, sobre quem somos e sobre as causas da angustia e ansiedade.
Somos uma união de contrários, de autoconsciência e de um corpo físico.
Emergimos da instintiva ação impensada dos animais inferiores e passamos a refletir sobre nossa condição. Foi-nos concedida a consciência de nossa individualidade e de nossa divindade parcial na criação, beleza e originalidade de nosso rosto e de nosso nome. Ao mesmo tempo e, inevitavelmente, nos foi dada a consciência do terror do mundo e de nossa própria morte e decomposição. Se há algo de constante à respeito da humanidade em todos os períodos da história, esse algo é o paradoxo que somos – nossa essência animal/humana.
Se é que se pode ‘cair para cima’, caímos na autoconsciência. Caímos ou entramos e, o fato da emergência da ignorância cômoda na natureza acarretou uma grande penalidade para raça humanal: deu-nos pavor ou angústia. Não se encontra pavor nos sub-humanos, exatamente pela razão de o animal não ser, por natureza, restringido pelo espírito – por uma identidade interior simbólica. O animal nada tem dessa identidade. Ele é ignorante e, portanto, “inocente”; mas quanto a nós outros – animais humanos somos uma “síntese de espiritual (autoconscientes) e corporal (físico) e por isso experimentamos angustia .
Quem dera pudéssemos ser um bicho ou um anjo, o que nos livraria do pavor. Quem dera pudéssemos ser totalmente desprovidos de autoconsciência ou totalmente não animais, condição que nos pouparia do terror.
Nossa ansiedade é uma função de nossa absoluta ambiguidade e de nossa completa impotência para superar tal ambiguidade e sermos francamente um bicho ou um anjo. Não podemos viver indiferentes ao nosso fado, nem podemos subjuga-lo seguramente e triunfar dele ficando fora da condição humana.
"Todo reino dividido contra si mesmo será arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá." Mt 12:25
Nosso espírito também não pode abolir a si mesmo, isto é: nossa autoconsciência não pode desaparecer, simplesmente... Tampouco uma pessoa pode mergulhar na vida vegetativa, isto é, ser inteiramente animal. Não podemos escapar ao pavor que, tem seu verdadeiro foco, não na ambiguidade humana propriamente dita, e sim, no resultado do “julgamento da humanidade”: se Adão comer do fruto da árvore da sabedoria, Deus lhe diz: “Certamente morrerás”. Por outras palavras, o terror final da consciência de nós mesmos é o conhecimento da nossa morte – é sabermos que vamos morrer que é nossa sentença peculiar no reino animal. Este é o significado mito do Jardim do Éden: que a morte é a maior e peculiar angustia de cada um de nós.
MG - Vassum Crisso
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